Reconhecido como um dos maiores nomes do psytrance global, o alemão Neelix tem uma relação especial com o Brasil e, em particular, com o Universo Paralello Festival. Autor de hits como “Bang Bang”, “Expect What”, “You”, “Makeup”, “Waterfall” e “Give it to Me” – collab com o brasileiro Sighter -, o produtor é conhecido também por sua energia carismática e interação calorosa com o público.
Natural de Hamburgo, na Alemanha, Henrik Twardzik é o “nerd” mais amado pelos brasileiros. Na última edição do UP, entregou momentos inesquecíveis, tanto na pista principal quanto no 303 Stage, onde conduziu um set retrô amplamente elogiado.
Sua trajetória na música eletrônica é longa. Neelix iniciou a carreira como DJ, tocando em festas de amigos e clubes. Em 1998, começou a produzir e, em 2002, lançou sua primeira faixa: “The Fourth”, que chegou pela Nova Tekk Rec, impulsionando sua carreira. Em 2008, já lançava seu quarto álbum, “You’re Under Control”, o que o levou a assinar com a lendária gravadora alemã Spin Twist Records.
Com seu jeito acessível e apresentações repletas de energia, o nerd do progressivo se tornou uma das maiores referências do gênero, figurando várias tracks no Top #1 dos charts do Beatport. A versatilidade e a habilidade de Neelix em criar conexões profundas com a pista fazem dele um dos artistas mais aguardados em qualquer lineup no país.
Este ano, ele retorna ao Universo Paralello, onde se apresenta novamente na pista principal e no 303 Stage. Sua relação com o evento, que atravessa uma década, transcende o ato de tocar: é uma troca energética, quase simbiótica, que reafirma a força do psytrance no Brasil e a importância do festival como um dos palcos globais do gênero.
A House Mag teve a oportunidade de conversar com Neelix para entender mais sobre sua conexão com o UP, o público brasileiro e o que podemos esperar de sua apresentação. Confira a entrevista a seguir:
Olá Neelix, é um prazer conversar com você, um dos artistas mais queridos pelos brasileiros. Você sempre traz sets cheios de energia e com uma conexão profunda com o público. O que há de tão especial no Brasil?
Oi, obrigado pela oportunidade de conversar com você.
O que é tão especial sobre o Brasil?! Quando comecei a fazer turnês pelo Brasil em 2007, só existia fullon trance e quase nada de offbeat trance. Eu toquei meu primeiro set no Enigma, eu acredito, e não sei por que, mas funcionou muito bem. Fiquei surpreso com a energia vindo da pista, inesperada e cheia de carinho. Desde esse dia, disse ao Vitor (CEO da Season Bookings): por favor, me faça vir mais vezes!
O Vitor decidiu, de qualquer forma, criar uma agência de bookings para estar mais próximo da cena. Desde então, ele me traz pelo menos duas vezes por ano para o seu maravilhoso país.
Já na segunda vez visitando o Brasil, o público me deu uma camisa de futebol com “Harry Progger” estampado, o que foi muito fofo. Eu recebo todo o tempo, quando estou no Brasil, presentes e muitos e-mails. Dois meses antes de uma turnê, minha caixa de entrada só tem brasileiros e a maioria dos comentários na minha página são do país.
Por que isso acontece, eu realmente não sei. O que eu sei é que eu amo os brasileiros, ou melhor, os humanos em geral, e talvez os brasileiros consigam sentir e honrar melhor essa qualidade do que em outros lugares. Às vezes, a energia do público nos eventos é tão forte que você realmente tem que se controlar para não chorar. É realmente intenso e curativo.
Como você vê a relação entre a cena psytrance global e o público brasileiro? Há algo no comportamento ou na energia da multidão aqui que se destaca em comparação com outros lugares do mundo? E como você descreveria a relação que você tem com o Brasil e seus fãs?
Claro que existem diferenças. Se você tem um país que é frio e escuro, você tem menos festas ao ar livre e mais clubes, o que definitivamente tem um impacto diferente. Você tem países que sofreram guerras e outras tragédias horríveis, o que molda os humanos que vivem lá. No Brasil, eu sinto que as pessoas têm menos medo ou simplesmente sabem melhor como deixar os assuntos que incomodam para trás. “Agora estou em uma festa e estou aqui para me divertir!” E eles realmente aproveitam a vida como alguns outros países também, só que um pouco mais enérgicos e barulhentos. Você pode ver isso em diferentes ocasiões, talvez no futebol ou no carnaval no Rio. É a mesma coisa que temos aqui na Europa, só que um pouco mais viva e amorosa na forma como as pessoas são.
Eu tenho uma qualidade estranha que, a princípio, soa bem, mas no final talvez não seja tão boa. Eu sempre tento realizar todos os desejos de todos que entram em contato comigo. Por isso, se alguém tiver uma placa dizendo “Me coloca no palco”, eu vou tentar o máximo que puder. Eu incomodo o Vitor o tempo todo: “Você pode colocar ele e ela na lista de convidados?”.
Os brasileiros talvez honrem essa qualidade um pouco mais do que outros países. De modo geral, o brasileiro é muito mais amoroso. Se eu vou ao Brasil para um show com dois mil convidados e a Helen faz um after movie, quase todos nesse evento curtem e comentam o nosso vídeo. Às vezes, eu traduzo os comentários e é de emocionar o coração o que eles dizem. Eu não tenho isso em outros países, para ser sincero, nem um pouco. Em alguns países, se você coloca muito esforço no resumo do evento, nem um comentário você recebe, mesmo quando coloca dez pessoas na lista de convidados.
Essa qualidade brasileira dá uma ideia do que é diferente no país. Vocês honram os artistas que fazem coisas boas, vocês mostram que ama algo e choram se necessário. Isso é diferente de todos os outros países que conheço.
Você já tocou algumas vezes no Universo Paralello e esse ano volta ao evento. Como tem sido sua jornada e evolução dentro do festival ao longo dos anos? Há algum momento especial que você lembra de suas apresentações anteriores?
Ah, claro, nem sei por onde começar. Em algum ponto, eu tinha mais bons amigos brasileiros do que alemães. Então, sempre que estou indo, encontro todos os meus amigos e celebramos o Ano Novo juntos. Pulamos sete ondas, o que traz sorte, saúde e sucesso. Eu não sabia disso antes, mas funciona! Conheço toda a família do Swarup há anos, quase décadas.
Na última vez, fiz um set retrô, que foi inesperadamente bom, e farei novamente este ano. Sempre produzo itens como bolsas, camisetas, copos ou, como desta vez, toalhas de praia. O que dá um pouco de trabalho para a minha equipe de gerenciamento, porque precisam carregar essas coisas, o que é bastante :D
O Universo Paralello tem algo que quase nenhum outro festival tem. Eles são mente aberta, permitem que artistas super diferentes se apresentem lá. “Você é mainstream, nós gostamos disso! Você é super underground, queremos isso!” É um festival onde você pode escolher o que gosta, porque todos os tipos de música estão lá. Eu gosto dessa liberdade do UP.
Sua energia contagia a todos, e sempre vemos você interagindo bastante com o público. Como você consegue manter essa harmonia com o público, principalmente em festivais tão grandes como o Universo Paralello?
Sim, é verdade, eu preciso ver a multidão e festejar com ela e, se possível, levar as pessoas para o palco. Imagine que você está na frente de uma sala de aula e o professor pede para você ler sua lição de casa. Se você está sozinho, é horrível, mas se você tiver alguns amigos ao seu lado, fica muito mais fácil. Por isso, eu sempre levo algumas pessoas para o palco. Elas tornam a performance especial, para ser honesto.
Mas tem outra razão para essa conexão acontecer. Imagine que eu te perguntasse qual forma de vida na Terra não é boa. Você prefere salvar animais ou humanos? Muitos diriam agora: “Os piores são os humanos e eu sempre salvaria os animais!” Nós não pensamos bem sobre nós mesmos, o que é um problema! Se a manifestação funciona, o que esse pensamento faz com a humanidade?
Você vai receber o que foca. Primeiro vem o pensamento sobre algo, depois a realidade se forma de acordo com isso. Todos os meios de comunicação, filmes e histórias da humanidade sempre dirão que somos ruins. Assim que você nasce, cresce com a falha de que somos ruins. Isso é o que todos pensamos no fundo, mas não é verdade!
Eu sei que agora todo mundo vai dizer: “Mas olha, eles são todos maus e fazem coisas horríveis!” É verdade, eles fazem. Mas não porque são maus, mas porque o sistema os empurrou para isso. O sistema é que é ruim, não os humanos!
Então, quando estou no palco, faço todos sentirem que eu os amo, não importa o que aconteça! Eu amo vocês, sempre! Talvez isso seja uma razão pela qual há uma conexão mais forte entre mim e a multidão, em comparação com outros artistas.
Estamos ansiosos para ver novamente seu set retrô no Palco 303, além de sua apresentação no palco principal. O que você está preparando para os fãs nesta edição do Universo Paralello?
Como eu fiz mais de duzentas músicas, é muito difícil escolher as tracks para o set retrô. Vou postar algo pedindo ideias, e os brasileiros sempre me ajudam nisso. Então, para ser sincero, não planejei nada ainda, mas vocês vão ver, vai ficar especial. Mas não é nada que você possa planejar, acontece por si só e então você sabe que há algo especial acontecendo. Venha se você estiver no UP e vamos ver!
Agora falando um pouco sobre o mercado, o que você acha que o público deve esperar nos próximos anos em relação aos eventos psytrance? Que mudanças e tendências você acredita que ocorrerão no futuro próximo e como os artistas podem se adaptar a elas?
Essa é uma boa pergunta! Acho que teremos alguns sons mais pesados na cena psy. Aqui na Europa, estamos tendo uma grande onda de hard techno. No começo, eu pensei: “O que é isso? É tão alto e mal produzido!”
Mas agora eu adoro essa nova forma de produção. Baterias mais pesadas, baixos distorcidos e bem ajustados às melodias. Eu acho que isso vai influenciar o psytrance. Eu já comecei a fazer algumas músicas mais pesadas e está sendo divertido!
E você está trabalhando em novas colaborações ou explorando diferentes influências musicais para seus próximos lançamentos? Você pode nos dar spoilers das próximas novidades?
Sim, estou trabalhando em uma colaboração com Will Sparks, Jilax, Durs, Interactive Noise e muitos outros. Mas algo novo vai surgir em 2025. Estou preparando um samplepack junto com Jilax. Não é um sample pack como muitos outros, é diferente. Nós inventamos uma coisa chamada “Freeform samples”. Você pode cortá-los em pedaços e usar apenas partes pequenas, o que vai ativar sua criatividade. Temos muitos vocais nele e muitos “song starters”. Estou realmente ansioso por isso, porque tem uma história.
Eu sempre começo músicas, mas muitas vezes nunca termino. Então eu pensei comigo mesmo: “Por que não fazer o bounce de todos os stems e colocar isso em um sample pack, para que outros possam terminar essas músicas?” Eu fiz isso e agora estou curioso para ver o que os outros artistas farão com isso.
É basicamente isso. Algumas outras coisas estão acontecendo aqui na Alemanha ao meu redor, sobre as quais eu gostaria de poder falar, mas acho que não há espaço suficiente para imprimi-las.
Muito obrigado por me pedir para escrever algo! Abraços,
Henrik
(O único brasileiro que não fala português)
Por Iasmim Guedes