Coluna Boreal Music Academy
Você sabe a diferença entre um manager e um booker? Todo artista deveria entender bem como o mercado funciona, e cada tipo de profisisonal que atua nele. Quando um artista está começando, ele precisa fazer quase tudo sozinho, e a media que vai crescendo, os DJs contam com uma equipe trabalhando nos bastidores para que suas visualizações e engajamento cresçam, seus lançamentos gerem expectativa pelo público e para que seu show seja contratado pelos produtores e eventos.
Dentre as pessoas que administram a carreira do artista, dois dos mais importantes são os managers e os agentes (bookers). Algumas vezes as funções destes profissionais acabam sendo confundidas pelo público, é normal. Sendo assim, conversamos com três dos maiores e mais profissionais agentes e managers do mercado brasileiro, para eles explicarem quais suas funções e as principais diferenças na atuação de cada um com seus clientes. E te ajudar na visão de mercado.
Denise Klein atua há mais de 10 anos vendendo os maiores artistas do país, já passou pelas maiores agências de bookings e hoje faz parte da Plus Network.
Felippe Senne é idealizador da HUB Records, da Nova Bookings e atua com alguns dos mais relevantes artistas do país, além de lançar pequenos produtores promissores.
Sarah Corrêa atua como manager de grandes artistas como Carola, e com o time internacional da Entourage. Confira o bate papo:
1) Quais as funções de um manager e as funções de um agente, e quais as diferenças entre eles?
Denise Klein: O agente basicamente tem dois clientes. Ele faz a ponte entre o contratante e o artista, negociando o cachê do artista, que é definido por uma somatória de fatores. Seria uma espécie de consultoria para o contratante, sempre sugerindo o artista que tenha o perfil do evento e dentro do budget destinado a contratação. O agente tem que ter um bom networking para buscar mais e melhores oportunidades para alavancar a carreira do artista, e junto com o manager, fazer um planejamento da carreira para o artista.
Ele também cuida de toda a parte contratual, financeira e da logística dos shows.
O Manager ou a agência de management é responsável pela gestão da carreira artística, definindo as vias para alcançar o objetivo do artista, aumentando a visibilidade e montando uma estratégia para impulsionar a carreira artística, que inclui a programação de lançamentos, tudo o que for ligado a imagem do artista , o posicionamento dele no mercado e as metas. Além de cuidar da parte legal e da gestão de finanças do artista, incluindo receitas, despesas, orçamentos e marketing do projeto. Com esses dois profissionais cuidando da carreira do artista, fica muito mais fácil para o artista focar na produção musical e nas gigs.
Felipe Senne: De forma bem resumida, na minha visão, manager é alguém que vai se associar ao artista no sentido de gerir todos os departamentos de sua carreira da melhor forma possível, inclusive injetando vários tipos de recursos no artista para conquistar seus objetivos. Não acho que exista apenas um modelo de atuação de um manager, mas basicamente é assim que enxergo a sua função – uma espécie de sócio no empreendimento que é uma carreira artística profissional com objetivos específicos.
Já o agente de bookings é o profissional que se encarrega pelo departamento de venda de shows, usando seu networking, visão, experiência e poder de barganha para tanto cuidar das questões burocráticas da contratação de um show do artista, quanto de questões que envolvem um planejamento estratégico para o desenvolvimento da carreira desse artista usando como ferramenta as suas apresentações.
Sarah Corrêa: As funções de um agente basicamente é focar em fechar datas para o artista tocar.
O management foca no gerenciamento da carreira como um todo. Esta função requer muita organização e também facilidade para lidar com pessoas e suas diferentes personalidades.
O manager tem um olhar global sobre a carreira do artista, é ela quem irá definir, junto com seu time e artista, as estratégias para alcançar os objetivos traçados e também irá gerenciar na prática a execução deste tático definido.
2) Quando um artista está preparado para procurar um manager ou um agente e como ele faz isso?
Denise Klein: A abordagem com a agência ou manager, pode ser feita por e-mail ou mensagem através das redes sociais. Uma indicação via outro contato do mercado, pode encurtar o caminho. Estar presente nos eventos e conferências do nosso mercado, é uma ótima maneira de se conectar. O artista pode nos procurar quando ele já alcançou um patamar significativo na nossa indústria e tem uma agenda de shows expressiva que mostra a demanda que ele já tem no mercado ou tracks que já lançados em lables conhecidas. Ele deve compartilhar o máximo possível de informações sobre a carreira, como suas produções, programação de lançamentos futuros, collabs, suportes, estatísticas de streaming, prêmios e engajamento nas mídias sociais. É importante também, mostrar o que o torna único e atraente como artista.
Felipe Senne: Para se associar com um manager eu acredito que o momento ideal é quando esse artista já é uma pessoa muito habilidosa no seu ofício – no caso da música eletrônica, alguém que já seja um ótimo DJ e/ou que seja um produtor musical de mão cheia.
Já em relação a ter uma agência de bookings (ou um booker pessoal), eu entendo que a melhor hora é quando o seu trabalho já tiver um mínimo de demanda por parte de contratantes de eventos. Sem um mínimo de demanda o booker fica muito limitado.
Sarah Corrêa: Na verdade, eu vejo o caminho contrário. Posso falar por mim, como manager. Eu e a Sabrina (minha irmã e sócia na Sismo Agency) estamos sempre de olho no mercado, observando nomes que enxergamos como um potencial para trabalharmos. Os artistas que representamos hoje, todos eles, o caminho foi ativo: ou seja, identificamos e fomos atrás para trabalhar junto como managers. Claro que o artista também pode procurar o profissional de management quando ele entende que é o momento, mas isso pode ser relativo. Porque falando de forma muito objetiva, muitas vezes a classe artística tem pouco senso crítico sobre o que está fazendo e de fato se enxerga como um baita produto, quando ainda está num estágio muito cru. Management exige dedicação dos dois lados, de todos envolvidos no projeto. E muitas vezes, o manager vai conseguir ter algum retorno financeiro anos mais tarde, muito depois do próprio artista, que detém a maior parte de sua carreira. Ou seja, é um trabalho de alto investimento de tempo e financeiro, direta e indiretamente.
3) O que você, como profissional, busca num artista para fechar negócio com ele?
Denise Klein: Para chamar a atenção de uma agência ou manager, o artista tem que ter conteúdo, autenticidade, uma identidade definida, engajamento, e produções musicais que sejam pertinentes com o que buscamos. Não necessariamente tocar o que está em alta no momento. Um diferencial no mercado pode ser também um atrativo.
Suporte ou collabs com artistas já consagrados também chama a minha atenção, mas ele tem que ter música boa! Ter alcançado algumas conquistas iniciais na carreira ajuda muito, mas eu já tive casos de artistas que apenas com uma track, chamaram a minha atenção e hoje conquistaram uma carreira internacional.
O público está consumindo bem mais conteúdo online agora do que antes. Mostrar o real lifestyle do artista hoje em dia já faz parte.
Felipe Senne: Na posição de manager eu procuro alguém que já seja um artista pronto do ponto de vista de produção musical, mas que tenha pelo menos a intenção de fazer pequenos ajustes na sua carreira para conseguir ser inserido nas “prateleiras” existentes no momento. No meu caso específico, preciso que a pessoa tenha confiança plena em mim, pois é um trabalho muito pessoal e íntimo, sem confiança as coisas não se desenvolvem.
Sarah Corrêa: Geralmente, o que bate antes de qualquer análise racional é o sentimento. Todos os artistas que hoje trabalhamos na nossa agência, a primeira memória é a sensação que tive quando ouvi suas músicas pela primeira vez. Isso é implacável.
4) Quais são as principais dificuldades que você está encontrando no mercado de música eletrônica hoje?
Denise Klein: Estamos enfrentando uma fase difícil no nosso mercado atualmente, acredito que um dos motivos seja o grande número de eventos de grande porte no país. Os festivais de música eletrônica se tornaram extremamente populares, mas afetaram diretamente o pequeno / médio produtor de eventos. Outro problema é a crescente de outros gêneros musicais que hoje competem diretamente em clubes que antigamente faziam apenas música eletrônica. Isso dificulta o meu trabalho para encontrar eventos para impulsionar a carreira dos meus artistas.
Felipe Senne: Hoje, julho de 2023, entendo que a cena eletrônica mainstream em que atuava se dissolveu – tanto por uma questão natural de ciclo de mercado, quanto pelo fato da pandemia ter esfriado muito o interesse do grande público pelo gênero.
Portanto, a minha grande dificuldade no momento é justamente o fato do mercado estar frio, com poucas oportunidades para grandes crescimentos de uma carreira nesse meio. Voltamos para o nicho, basicamente. Mas ao mesmo tempo surge a oportunidade de desenvolver novos artistas em novas sonoridades, sempre há um lado positivo em qualquer situação.
Sarah Corrêa: O mercado encolheu, ainda como reflexo da crise econômica gerada pela pandemia. Além disso, o consumo de música ao vivo sofreu um impacto, a cena em si, em termos de gênero musical está num processo de transição. Tem muita novidade rolando, mas ainda é cedo pra dizer o que vai ficar, o que irá de fato durar. Somando estes fatores, dentre muitos outros, a maior dificuldade que enxergo é, no meu caso, segurar a ansiedade para entender o que vai se consolidar, em termos de artistas e sub-gêneros nos próximos anos. E, claro, espero que o cenário econômico no geral melhore para que as pessoas voltem a gastar mais nas festas e a comprar mais ingressos. Porque é desta forma que toda a cadeia gira
5) Ao seu ver, em que áreas e aspectos o mercado brasileiro e os profissionais inseridos nele ainda precisam evoluir?
Denise Klein: Faltam condições igualitárias entre os gêneros. A representatividade feminina na música eletrônica, sem dúvidas, está mais significativa, cada vez mais as mulheres estão conquistando espaço em um cenário proeminentemente masculina, mas ainda precisamos de mais iniciativas em prol do reconhecimento das mulheres. É perceptível o baixo número de mulheres nos line ups. Existe o preconceito por achar que uma DJ mulher pode não ser tão capaz quanto um DJ homem e ainda existem os julgamentos machistas. Precisamos de mais espaço para que as produtoras brasileiras mostrem seus sets e tenham visibilidade
Felipe Senne: Acredito que é necessário evoluir nas questões mentais desse tipo de carreira – é preciso cuidar com mais carinho da saúde mental de todos os profissionais desse meio, não apenas do artista.
Por ser um mercado muito volátil e competitivo, o burnout é praticamente uma regra, principalmente entre as pessoas que estão no topo do jogo. Temos que investir na preservação da sanidade mental de todo mundo.
Com essas respostas, fica claro a atuação dos agentes e dos managers junto ao DJ e a importância de ambos na carreira dos artistas para que sigam os melhores caminhos e sejam, de fato, profissionais em todos os aspectos e conquistem os objetivos traçados.