A música é uma das formas de expressão da arte mais antigas das quais temos registros na humanidade. Tem-se conhecimento que desde a pré-história os humanos se relacionam através dela.
O tempo passou e diferentes instrumentos, ritmos, gêneros musicais e formas de viver a música foram se adaptando conforme a evolução da civilização. Durante o período de colonização das Américas e da escravização do povo africano, a música era uma forma que estes encontravam para manifestar sua cultura, se sentirem humanos novamente e se reconectarem com suas raízes.
Diante dessa situação, a música feita pelos pretos foi ganhando mais elementos, conversando com outros estilos e se desenvolvendo até chegar em ritmos que conhecemos hoje como por exemplo blues, funk, rock and roll, jazz, hip hop, soul, disco e como poderíamos nos esquecer dos nossos amados house e techno?
Para entender mais sobre a comunidade negra e a música eletrônica precisamos voltar um pouquinho na linha do tempo.
Na década de 70, a disco music e as discotecas estavam bombando nos Estados Unidos, principalmente em Nova York, Filadélfia e Chicago. O estilo era derivado do funk e do soul, com um ritmo extremamente dançante e moderno cheio de instrumentos elétricos. As casas lotavam e as pessoas extravasavam toda sua alegria.
Nada de errado nisso, ne?! Menos para as autoridades preconceituosas da época.
O motivo? As discotecas eram onde os pretos, gays e periféricos divertiam-se.
Nessa época, o gênero viveu seu auge e seguiu firme apesar da repressão policial. Revelou para o mundo artistas que fizeram história e são celebrados até hoje como Bee Gees, ABBA, Donna Summer, KC and The Sunshine Band, Michael Jackson, Barry White e até brasileiros como os saudosos Tim Maia e Rita Lee.
No Brasil, nos anos 70, também sob forte influência da disco music e da união do povo preto, um dos maiores movimentos culturais acontecia por aqui. O Black Rio foi um período que as discotecas eram espaço para os negros mostrarem seu melhor penteado black, sua melhor roupa, se sentirem emponderados e bonitos. Também sofriam muita repressão policial, principalmente pelo preconceito e por se tratar do período da ditadura militar no Brasil.
Como tudo na vida são ciclos e evoluções, a disco music que era a onda do momento para a comunidade preta deu espaço à sua filha house music no início dos anos 80. Pegando embalo na efervescente cena de Chicago, o house surge como um meteoro.
DJs como Frankie Knuckles, Larry Heard e Marshall Jefferson foram alguns dos inúmeros responsáveis pela internacionalização do gênero que permeia até hoje, além do lendário club Warehouse, onde Knuckles era residente.
Assim como na década de 1970, o movimento house continuava majoritariamente com público preto, gay e periférico, mas atraindo cada vez mais pessoas de outras áreas da sociedade. Iniciava-se ali a difusão da dance music para todos com a mensagem da inclusão, diversidade e respeito acima de tudo. As noites nos clubs também eram alvo de uma moda ousada, expressiva e desafiadora para a época.
Também na década de 80, o techno surge em Detroit, nos Estados Unidos. Encabeçado por Derrick May, Juan Atkins e Kevin Saunderson, que formam o grupo The Belleville Three, o gênero bebeu de fontes que já estavam nos Estados Unidos como disco, blues, funk e daquilo que vinha da Europa como a música dos alemães Kraftwerk.
O techno soava como um som futurista, cheio de elementos psicodélicos, sem muito ou nenhum vocal e repetitivo (o que, cá entre nós, é bom demais), mas que combinava com aquele momento de Chicago. A cidade passava por uma revolução industrial e social, que podia ser canalizada no techno e transmitida para o mundo.
Assim como o house, o techno cruzou o oceano rapidamente e se tornou popular por toda a Europa, principalmente Alemanha, e também dava liberdade de expressão para os clubbers.
Todo o movimento da música eletrônica, sua criação, valores e lifestyle tem influência direta da cultura e do povo preto, portanto no Dia da Consciência Negra no Brasil, a homenagem não poderia ser diferente se não resgatar as origens do que vivemos e acreditamos em 2024.
Por Adriano Canestri