Nuno Deconto sobre seu novo EP, Runner

Por Marllon Gauche

Foto de abertura: divulgação

O brasileiro Nuno Deconto já realizou o sonho de muito artista da música: ficar imerso na cena eletrônica de Londres e Berlim, cidades que são algumas das maiores referências mundiais, berço de grandes DJs e produtores. Por lá ele passou mais de 10 anos tocando em diversos venues importantes e, em 2014, criou o coletivo Diskonnekt ao lado de Giovanni Calemma, dando vida a uma experiência que buscava resgatar a cena techno underground de Londres.

Neste meio tempo, Nuno também somou ao seu currículo passagens pelo Boom Festival (Portugal), Ozora Festival (Hungria), Universo Paralello (Brasil), Apparitions Festival (México), além de residências em clubs como Sisyphos e Rummels Bucht, em Berlim. Naquela época, Nuno já produzia algumas faixas, mas tinha preferência por não lançá-las para utilizar exclusivamente em seus DJ sets.

Foi apenas em 2017 que ele decidiu se lançar como produtor musical, emplacando uma faixa na coletânea do Cocada, iniciativa de Leo Janeiro e Roland Leesker que recebe o apoio da Get Physical. Desde então, tem aprimorado cada vez mais seu trabalho de estúdio, o que lhe rendeu seu mais novo EP por outra gravadora alemã, EKORD. “Runner EP” chegou no dia 20 de setembro com duas tracks originais do brasileiro e um remix feito pelo japonês Hiroshi Watanabe.

O disco possui batidas atmosféricas e linhas de baixo fortes com notas cintilantes e melodias voltadas ao dub techno com uma pegada de acid. Para saber um pouco mais do processo de construção deste trabalho, conversamos com Nuno, que nos contou mais detalhes de “Runner”. Confira!

HM – Soubemos que o EP foi inspirado no sintetizador Yamaha CS-80. Você o utilizou para produzir o EP ou buscou chegar numa sonoridade mais próxima através de outros equipamentos? Se foram outros, quais?

Sim, utilizei o VST que a Arturia fez, o CS-80V, onde eles adicionaram uma matriz de modulações diferentes do original, perfeito para sound design. O CS-80 é um synth polifônico com sons cheios e completos e é famoso pelo seu incrível som de pads gerando emoção. Esse foi o motivo principal de utilizá-lo.

Eu nunca tive o synth original, mas na faculdade em Londres tive certa prática nas aulas de sound design. Eu criei os chords, leads e pads atmosféricos e modulados inspirados no filme através do VST. Eu gosto muito de trilhas sonoras de filmes e sempre procuro buscar referência para sound design, especialmente para criar algo meio espacial. O primeiro Blade Runner tanto o primeiro Terminator são ótimas referências em relação à sintetizadores. 

HM – Imagino que neste caso você teve que ser bastante perfeccionista para chegar ao som que desejava. Essa é uma característica sua? Como foi o processo de construção das faixas? Quanto tempo demorou?

Digamos que se pode chegar a um nível maior com a repetição, especialmente no processo de gravação. Posso dizer que sim, sou muito perfeccionista, mas o que eu realmente queria era que fosse algo diferente e original, mas que não perdesse a minha principal influência: o soul de Detroit Techno.

O processo criativo demorou uns dois meses e começou com inúmeras jam sessions gravadas, onde finalizei com cinco tracks envolvendo o bassline de dub techno e o chord protagonista modulado. Depois fui cortando, editando, criando mais elementos para cada uma delas é aí começou a ganhar forma. No processo de mix foi quando enviei para o Hiroshi [remixer] pois queria uma opinião dele, foi surpreendente quando ele respondeu que queria fazer o remix de uma delas.

Foi aí que o EP começou a ganhar forma e escolhi as faixas para o release. Coincidências à parte, a cidade do filme Blade Runner, de 1982, era uma “Los Angeles futurista”, que parecia mais com Tokyo, terra do Hiroshi. Ao todo levei cinco meses para finalizar o EP, incluindo o remix do Hiroshi e a masterização feita pelo estúdio Space Echo de Roma. 

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HM – Apesar de alguns bons anos de carreira como DJ, você pode ser considerado como um produtor ainda “novato”, porém, seus suportes demonstram a qualidade de seus trabalhos. O que uma música deve ter para ser de alto nível? O que você mais preza?

Acho que a arte de ser um DJ inclui o lado pesquisador e o desejo de ter um repertório de tracks exclusivas, além de habilidades com o mixer, tocar o “unknown”. É fundamental ter referências das raízes da música eletrônica para atingir qualidade tanto tocando ou produzindo.

Música de alto nível vem com a experiência musical e conhecimento tecnológico e técnico. É preciso muita disciplina, pesquisa, estudo e muita, mas muita prática. Horas de estúdio, tocando synths, criando drum loops, gravando, editando e aprimorando técnicas de mix. O ouvido tem que ser lapidado para você chegar a qualidade extrema, é um aprendizado eterno  e eu sei que tenho muito o que aprender para chegar onde eu quero.

Não tenho dúvidas que, para inovar, é preciso conhecer bem as novas tecnologias e principalmente dar cada vez mais qualidade as produções. Tudo isso me influencia muito para tentar produzir algo diferente quando estou no processo criativo no estúdio em busca de algo futurístico e novo como muitas de minhas influências fizeram.

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Foto: divulgação

HM – Como você chegou até a EKORD? Era uma gravadora que você já acompanhava os trabalhos? E o contato com o remixer?

A EKORD eu conheci através do Johnny da Cruz, dono do label, quando voltei a morar no Brasil. É um belo trabalho desta gravadora alemã nascida em terras brasileiras. O Hiroshi eu conheci em Londres, em 2016, quando eu contratei ele para a Diskonnekt, festa na qual acontece até hoje, só que super low profile. Ficamos amigos e sempre mantemos contatos através de música. Quando voltei a morar aqui comecei a trabalhar com ele pela minha empresa Konnekt no mercado da América do Sul, fazendo essa conexão entre Brasil e Japão com um dos artistas mais respeitados da Ásia.

HM – Se você pudesse escolher cinco venues [clubs ou festivais] onde pudesse tocar sua track, de acordo com a atmosfera que você acredita que ela tenha, quais seriam?

Focando no Brasil, acho que a track pode ser tanto para algo mais intimista como D-Edge, Caos e Terraza ou para algo mais amplo como Universo Paralello e Tribaltech. 

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