Sasha review, reconectando-se ao Templo

Por Jonas Fachi

Fotos por Gustavo Remor e Ebraim Martini

Sasha não pode ficar quatro anos sem apresentar-se no Templo! Inicio esse review clamando para que a curadoria volte a colocar seu nome como peça indispensável no calendário anual do club. Sua história com essa pista é inigualável e sua felicidade estampada no rosto ao amanhecer indica por um retorno breve. Se possível, com mais tempo ainda do que às cinco horas concedidas no último dia 4 de janeiro. Sou suspeito para falar, Sasha foi meu primeiro ídolo musical e vê-lo no palco ainda me causa nervosismo como nos primeiros dias de Warung.

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Expectativas

Alguns amigos mais novos estavam ansiosos e me questionando sobre o que poderiam esperar do set da lenda. Eu estava o acompanhando de perto, havia ouvido várias vezes seus podcasts pela Last Night On Earth gravados ao vivo em diversos clubs do planeta durante 2019. Eles me apontavam que ele estava na melhor fase dos últimos 10 anos como DJ. “Sasha sempre começa nebuloso, devagar, parece estar perdido, é sua natureza. Ele precisa de tempo e uma pista paciente. Depois, quando você se der conta, estará com as mãos na cabeça completamente atônito’’. Esse era o recado que eu passava, e assim Sasha fez acontecer.

Sem warm-up

A seu convite, o artista da LNOE Fell Reis fez sua estreia no club fazendo o warm-up. Ouvi sua última hora de set e confesso que poucas vezes fiquei tão incomodado vendo um artista tocar. Onde estava o warm-up? Completamente perdido no tempo, Reis jogava faixas explosivas aleatoriamente como se estivéssemos às 5h da manhã. Foi uma decepção e uma pena ver um artista jogar fora a chance de abrir a noite para um dos grandes da história no Templo em troca de seu interesse particular em tocar suas “favoritas’’. Seguimos.

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Sasha

Recomeçar

Ao surgir na cabine, os mais atentos a frente do palco começaram a gritar e ovacionar Alexander Paul Coe, ou simplesmente, Sasha. Ao assumir o comando às 1h15 com uma introdução obscura, sem batidas e com sub bass vibrando o sistema de som, ele claramente demostrou querer zerar a pista e recomeçar a noite para o público poder compreender sua construção de set de forma mais clara.

Ainda que as batidas fossem fortes, o ritmo era calmo e logo nas primeiras músicas ele tratou de colocar todos no mesmo balanço. Sem build ups e breaks estendidos, apenas mixando e mixando o mais linear possível. Eu sabia que muitos iriam achar estranho tamanha baixa de energia na pista, mas esse era o propósito – apenas aproveitarmos a música e deixarmos os grandes momentos chegarem na hora apropriada e de forma natural.

Pura classe

É difícil destacar músicas quando um artista com a genialidade que Sasha possui resolve preparar um set especialmente para uma noite.

A quantidade de faixas incríveis em sequência me colocou em um labirinto sem saída do que escolher para mencionar, afinal, todas eram de alto nível. Aliás, essa é a combinação que faz história, uma seleção arrebatadora sendo jogada com uma ideia de construção com início meio e fim bem definidas. Some isso as mãos de um cara que mixa como ele –  temos um set épico pronto. “Master class”, o “estado da arte’” na progressão misturando house e techno. Sasha estava inspirado! Atributos diversos podem ser dados a um set tão bem apresentado e com um nível de concentração que eu esperava dele há muitos anos.

Tracks como “Garden” de &Me, “Coming Back” de Eli & Fur, “Bends” de Ejeca, “Trooper” de Joseph Ashworth, “All That Injures Lies Within” de Hacobb, “Boon” de AFFKT, são algumas das que mais me encantei. Em especial, coloco “Melody Of Love” da banda Hot Chip com remix de PBR Streetgang, com seu arranjo e vocal que me fizeram voltar na metade dos anos 2000, época que comecei a ouvir música eletrônica. Também, “E.V.B.T” de Krystal Klear e Kodi Najm também me trazendo uma sensação nostálgica enorme, de quando apenas era um sonho vê-lo tocar.

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Ápice no amanhecer

Após estabelecer um ritmo bem dançante a partir das 4h, Sasha manteve-se na mesma pegada até às 5h30, colocando momentos explosivos bem pontuais. Parecia que ele já havia entregado tudo de si e que o set iria se tornar repetitivo. Porém, estamos falando de um dos maiores DJs de todos os tempos. Na última hora comprimiu o que geralmente precisaria de duas para fazer. Sem que ninguém percebesse, ele foi trazendo sua clássica energia viajante e transcendental repleta de efeitos delirantes. Essa energia foi agraciada com os raios solares que surgiram quando todos achavam que iríamos ter um amanhecer nublado.

“Leave a Trave” de CHVRCHES com remix de Four Tet fez todos pularem junto com ele. Que momento! Não há duvidas que o Warung juntamente com o club Fabric de Londres são os dois lugares favoritos dele para expressar sua arte musical. Um produtor com tantas músicas autorais incríveis e que quando está como DJ, mostra uma outra face tão genial quanto. O fato é que o público não esperava ouvir as famosas músicas autorais dele, e sim ter uma experiência de alto nível que poucos conseguem entregar. Próximo do final, eu já esperava alguma música old school que ele sempre tem na case. “Future” de Kevin Saunderson com remix de Kenny Larkin foi a escolhida para coroar os momentos finais de pura emoção. Uma das faixas mais reconhecidas da dance music sendo jogada no momento certo. Não deu outra – delírio coletivo. Ver toda uma pista vibrando e sorrindo por estar participando de um momento que marcou a história do club (mais uma vez) foi um privilégio enorme. Eu não estava em 2006, mas sim em 2020.

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De volta ao seu melhor

Muitos dos clubbers que dançaram fervorosamente e se emocionaram como nunca com um amanhecer digno da era de ouro do Warung eram apenas crianças quando Sasha fez sua lendária estreia no club durante o carnaval de 2006. Naquele dia, em poder de sua famosa Maven Control, ele tocou por 10 horas e fez o que muitos chamam de “o melhor set da história do Templo”, jogando o que tinha de melhor somado ao seu auge na carreira.

Quatorze anos depois, o galês veio para estremecer as bases do club, além de remarcar a busca de um título que um dia já foi seu por unanimidade, do set mais impressionante do ano! Depois de ser ídolo de toda uma geração, ele parece que conseguiu finalmente se reconectar com sua pista favorita no planeta. Como nos velhos tempos, flertou com o techno como sempre soube fazer, nos engrandecendo com uma verdadeira aula de mixagens de tirar o fôlego, ritmo contínuo, progressão misteriosa e leve acidez. Características que carrega consigo desde o final dos anos 80.

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Sob aplausos que duraram mais de um minuto somados ao clássico canto de “Oleeê, Olê, Olê, Oleeê, Sasha, Sasha!”, ele desceu da cabine extremamente emocionado e agradecendo por existir uma pista capaz de retirar os sentimentos de emoção mais profundos até mesmo de um artista que foi um dos pilares do que entendemos como música clubber underground.

Para deleite dos seus fãs, Sasha disponibilizou duas horas do seu set no Templo através de seu podcast na LNOE. As horas da noite são às 3h30 até 5h30. Divirta-se!

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