Por Rodrigo Airaf
Fotos: divulgação
Antes somente um “pequeno tranceirinho”, comecei a me aventurar de verdade no tech house, techno e afins em 2013, mais ou menos. Só se falava em Victor Ruiz na minha cidade, Brasília, que não era nenhuma São Paulo e contava-se nos dedos os rolês com esta proposta de som. Acabei vendo um pouco dessa história acontecendo nas duas vezes que vi o artista na capital, e isso mudou um bocado o caminho que eu passei a seguir como amante de dance music.
Victor foi, de fato, um dos meus pontos de partida e o de uma galera também. Seu estilo de som consideravelmente autêntico o levou a grandes patamares, influenciou uma boa parcela de uma geração de jovens produtores e ultrapassou fronteiras. Além disso, Victor também se consagrou como remixer de artistas internacionais classe A como Moby, Stephan Bodzin, Olivier Giacomotto, Oliver Huntemann, Thomas Schumacher e Dubfire.
Foi, portanto, com faixas consagradas célebres e com apresentações tanto no Brasil quanto no exterior, como no Fusion, festival alemão conhecido por proporcionar um ambiente utópico com grandes experiências musicais e onde Ruiz fez uma de suas performances mais emblemáticas, que o DJ construiu sua história como um dos artistas brasileiros mais queridos do cenário.
Cat-lover, também rockeiro e absolutamente intuitivo, foi percebendo que não se faz a mesma coisa por muitos anos — especialmente quando um estilo de som começa a ramificar-se de DJ para DJ em grande velocidade — e acabou virando a chave para explorar um caminho ainda mais pessoal na música eletrônica, mesmo que estivesse vivendo o que se pode considerar um dos seus auges.
De lá para cá, na real, sua influência permaneceu intacta e seu som pousou em selos como Senso Sounds, Suara e Tronic. O escopo musical de Victor Ruiz está cada vez mais amplo, intrigante e livre de amarras, do jeito que se espera de um grande artista. Voltaremos a assisti-lo na próxima sexta, dia 15 de junho, no queridíssimo CAOS, em Campinas, ao lado de Chris Liebing e Ney Faustini, e por isso decidi bater um papo muito legal com o paulistano. Confira abaixo:
HM – Victor, prazer em falar com você! Quando a gente cresce na carreira, algumas coisas deixam de ser novidade, mas no começo costumamos comemorar cada uma de nossas pequenas vitórias. Qual foi o momento (ou os momentos) que você sentiu que um salto iminente iria acontecer, que “agora a coisa vai ficar séria” e deu aquele frio na barriga?
Olá! O prazer é todo meu. Até hoje eu comemoro as “pequenas” conquistas do dia-a-dia, é uma forma de sempre ter o pé no chão. A gratidão é uma energia muito poderosa e deve ser praticada diariamente, por isso sempre vejo todas as coisas e agradeço. Agora focando na sua pergunta, não houve um momento específico que eu percebi, foi um conjunto de um trabalho constante e consistente de muitos anos, que trouxe todas as coisas incríveis para minha carreira. Acho que os momentos que mais senti frio na barriga foram as duas vezes antes de subir no palco do Lollapalooza. É algo muito grande e ambas as vezes foram muito especiais.
HM – Talvez você já tenha respondido esta algumas vezes, mas sempre quis ouvir de você quando e como foi que você quis dar o basta no seu som de alguns anos atrás aqui no Brasil, pois eu sei que na Europa você sempre tocava mais livremente e eu sei também, por ser meio que filho daquela cena, que você foi referência para muitos DJs. Teve que ser colocado muito foco e planejamento para esta transição ou tudo aconteceu organicamente? Você sentiu que estava assumindo um risco?
Essa mudança se deu no fim de 2013, com a minha primeira ida à Alemanha. Fiz um tour de 12 dias por lá e não sei explicar como, mas simplesmente aconteceu. Desde então foi automático convergir para um outro caminho. Se você ouvir minhas produções prestando atenção nas datas, você consegue ouvir levemente a inclinação para tal caminho. Eu não podia simplesmente mudar do nada, porque sabia muito bem o que podia acontecer. Então tive que ter muita paciência, foco, além de ter engolido muitos sapos de pessoas falando mal de mim dos “dois lados” – fãs antigos e pessoas que torciam o nariz para mim pelo som que eu fazia.
Foi um risco que assumi sim, mas eu apenas segui o meu coração e de alguma forma eu sabia que tudo ia dar certo. Faz parte da experiência do amadurecimento profissional e pessoal de cada ser humano passar por esses desafios, e eu fico muito feliz de ver o meu caminho e onde cheguei. Ainda há muito mais por vir.
“A gratidão é uma energia muito poderosa e deve ser praticada diariamente”
HM – Numa visão realista, ainda que o techno não seja um gênero tão frágil dentro de suas próprias fórmulas como os sons mais “EDM”, eu acredito que não dá para excluir o Techno da possibilidade de saturar rapidamente. Você concorda com isso?
Sim e não. O Techno, ainda mais hoje em dia, tem tantas vertentes que acho difícil saturar completamente. Tem artistas que focam sempre na mesma fórmula e isso, para mim, já satura. Sou a favor do gênero ser o mais versátil, complexo e cru ao mesmo tempo e estar em constante evolução. Essa é a beleza do Techno. Abrange tantas esferas que você é livre para onde quer ir musicalmente.
HM – Você já tocou muitas vezes em Campinas, onde o público da dance music vem evoluindo muito rápido e abrindo ainda mais a cabeça para os sons diferentes. Dentro desse contexto, foi possível que se inaugurasse o Caos. Está curioso sobre este club? Você pretende fazer lá um set tão “prafrentex” como os partygoers de lá?
Sim! Eu amo tocar em Campinas e estou muito ansioso para a minha estreia no Caos. Adoro todos os donos do club e me sinto em casa sempre que toco em festas deles. A recepção é sempre nota 10. Pelo que estou vendo, a expectativa está grande para essa noite e eu vou fazer um set bem especial, cheio de música nova.
“Sou a favor do Techno ser o mais versátil, complexo e cru ao mesmo tempo e estar em constante evolução”
HM – Alguma música, álbum ou artista do passado que tenha te dado o “clique” na mente, aquele momento de surpresa tipo “porra, isso é genial e mudou minha visão musical”? E que tal citar também um som ou artista genial de hoje em dia, se ele existir? Cite os motivos, se puder.
Eu sempre fui muito influenciado pelo rock ‘n’ roll, e minha coleção de álbuns era enorme quando mais novo, portanto é difícil escolher um. Vou citar alguns: “Led IV” do Led Zeppelin, “Sgt. Pepper’s” dos Beatles, “Violator” e “Black Celebration” do Depeche Mode, “Homework” do Daft Punk e “The Man Machine” do Kraftwerk. Hoje em dia tem muita coisa incrível que tenho ouvido: “Singularity” do Jon Hopkins, “Add Violence” que é um EP recente do Nine Inch Nails, “The Devil’s Walk” do Apparat (não tão recente assim) e não podia deixar de fora o “Concrete and Gold” do Foo Fighters.
HM – Vamos deixar a imaginação agir por um instante no futuro. Há alguma participação importante, um convite irrecusável, uma gig em um lugar emblemático ou até mesmo alguma conquista pessoal que te deixaria com ainda mais sensação de “dever cumprido” se acontecesse nos próximos anos?
Há tantas coisas que se passam em minha mente sobre carreira, mas acho que o projeto mais legal que miro em fazer um dia é abrir alguma instituição para ajudar pessoas que não tem condições financeiras a aprender e praticar música. Seja como baixistas, guitarristas, bateristas, vocalistas, DJs, produtores, o que seja. Ter a chance de ajudar pessoas a conquistar seus sonhos me anima muito!
“Tive que ter muita paciência, foco, além de ter engolido muitos ‘esporros’ de pessoas falando mal de mim dos `dois lados`”
HM – Sobre o futuro palpável, agora que estamos no meio do ano, o que podemos esperar de você no próximo semestre? Há novidades que já podem ser compartilhadas?
Em julho tem o lançamento do meu EP “The Eye of the Beholder” pela Noir Music, com faixas que eu amo: a faixa título, “Tormenta”, e “Rainbow in the Dark” – uma faixa que gravei quase que 100% com synths analógicos, sem midi, tocando na raça até acertar. Ela tem um feeling diferente que eu amo. Por ora é isso o que posso divulgar. O resto vocês verão em breve! :)