Review: Movement Detroit 2016, a cidade do techno

Por: Danilo Helmeister
Fotos: Brandon Rabotnick e Bryan Mitchell

Assim como o techno de Detroit, sem dúvidas o Movement é um clássico dos festivais mundiais. O antigo DEMF (Detroit Eletronic Music Festival), que começou gratuito e hoje é organizado pela Paxahau, tem que estar na sua lista se você gosta de techno!

São três dias de festival, das 12h à 00h, começa no sábado e termina na segunda no feriado do Memorial Day. A cidade se volta para o festival e é decretado Techno Week, a semana oficial do techno, pela prefeitura da cidade. A melhor comparação que poderia fazer para nós, brasileiros, é que o Movement é o carnaval do techno. Além do festival, durante a Techno Week, há uma infinidade de festas rolando em clubes, casas, bares e até museus. Há afters e afters dos afters, festas oficiais, não-oficiais… é o paraíso clubber (rs). Aviso: o Movement não é um festival como os outros, não tem pirotecnia, não tem cenografia, a música é o principal.
 

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A viagem para o Movement começou no Brooklyn, em NYC, onde encontrei mais três amigos. Nós alugamos um carro e dirigimos 10h até Detroit. Era a primeira vez deles, então eu estava muito ansioso para apresentar-lhes a cidade.

Chegamos em Detroit na sexta, 27.05, por volta das 19h (horário local) e o clima já era de festival, muita gente pelas ruas e fazendo check in nos hotéis. Chegamos cansados, afinal, além das 10h de viagem, nosso período em NYC foi marcado por IPAs e clubs, mas animei a galera, era nosso primeiro dia, não podíamos perder as festas de “abertura”! Enquanto isso, já falava com um casal de amigos, Jenn e Tony, que frequentam a cidade nessa época há aproximadamente 16 anos (eles nem vão para o festival, só para as festas) e marcamos de nos encontrar no The Works um club de Detroit.

A The Works é meu clube preferido: underground, com soundsystem e line ups monstros… ótimo para uma primeira impressão. Não decepcionou. São três pistas: uma na entrada, uma principal e uma externa. Chegamos e na pista principal estava tocando o Drumcell. A única iluminação era um painel de led que tomava toda a parede atrás do DJ – devia ter um 3×10 metros de tamanho e estava sendo comandado finamente e transmitindo imagens abstratas. O Drumcell tocou coisas como Bas Mooy e Surgeon, aliás, na The Works, o techno pesado (mas não necessariamente rápido) e quebrado (offbeat) dominam; é o local mais indicado se você, assim como eu, gosta dessa linha. Era difícil escolher a pista, pois era só som bom, Drumcell foi o melhor; vi um pouco do Function que encerraria a noite e começou muito bem, só pedrada, entretanto precisávamos ir embora, era só a primeira noite em Detroit… O saldo da noite: meus amigos já estavam amando Detroit, já perceberam que quem estava lá queria techno sério e que a galera da The Works era “technohead” como nós.

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No sábado, o primeiro dia de Festival, queríamos chegar cedo. Eu queria ver o Project 313 na Pista Underground e assim aconteceu. Chegamos por volta das 14h, comemos dentro de festival mesmo e já desci para a pista. O live da dupla local foi animal: pesado e muitas vezes quebrado no offbeat… treta! Começamos bem. A este ponto meus amigos já estavam adorando o festival, e já perceberam que lá o público já é mais diversificado (diferente da Works), pois misturam-se clubbers de toda a parte, jovens em busca de diversão e até alguns fanfarrões. Embora mais diversificado, tenho a impressão que a maioria sabe o que está fazendo e sabe o que significa estar em Detroit.

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Após o Project 313, tocou o Andrei Morant, que seguiu a linha dos seus antecessores na pista Underground. Fui dar uma olhada no som do Paul Woolford, na pista Made in Detroit, da Thump; a pista estava animada e o som bem alto. Na minha opinião, acho que foi a melhor pista deste ano, sempre cheia e animada, tocando uma linha mais “tech-house detroitiana”. Depois dele tocou o Mathew Dear, vi um pouquinho, ele tocou “Fly Life” (do Basement Jaxx), galera deu aquela surtadinha, mas infelizmente tiver que sair da pista para resolver umas paradas fora do fetival.

Ainda no primeiro dia, dei uma olhadinha no set do Seth Troxler no main stage, eu não sou muito fã do som dele, mas a galera no geral gosta bastante e lotou o palco principal.

No primeiro dia de Movement estava muito ansioso para ver o live Borderland do Moritz Von Oswald com o Juan Atkins, dois monstros, e enfim, talvez pela enorme expectativa que criei, achei o live burocrático… desempolgante. O último disco deles ficou muito bom, mas eles tocaram as músicas sem virar, sem empolgar, enfim… estava vendo-os e, de lá do main stage, podia ouvir o Stacey Pullen fazendo miséria na Made in Detroit, e tive que ir para lá, afinal, depois dele, ia tocar o Carl Craig; sem arrependimentos: o Stacey Pullen, estava tocando um techno dançante, com bass poderoso, muito bom. Na sequência dele entrou o Carl Craig que começou agradecendo por estar ali; ele sampleou um pedaço do discurso da “Can You Feel It” do Larry Heard, só o pedaço que fala “It’s my house” e “loopou” para começar o set (impossível não chorar enquanto estou escrevendo isso), foi f***… ele estava muito feliz e à vontade, sou fã do C2… ele tocou de tudo, o cara é mestre, vira qualquer coisa, saía de um track techno e começava uma disco como se fosse a coisa mais fácil do mundo… O ponto máximo, para mim, foi quando ele tocou Floorplan – Never Grow Old, foi de chorar… ele terminou o set com o loop do Larry Heard e com um discurso de agradecimento. Foi “O SET” do primeiro dia na minha opinião.


Vídeo caseiro encontrado no Youtube

Vi ainda um pedacinho do set do Scuba e do Len Faki, e para minha surpresa, estava rolando um espancamento sonoro. Digo que isso me surpreendeu pois, em minha opinião, as últimas produções do Scuba têm sido meio mornas, e o Len Faki estava no mesmo ritmo: mais enérgico do que de costume. Em geral a pista Underground foi bem quadrada e pesada (mas não rápida em excesso, ficou nos 128 a 135 bpms).

Alguém deve estar perguntando: “mas e o Kraftwerk? Você não viu?”. Não vi, já tinha visto o show 3D e eu estava sedento por “techno puro”.

Saímos uns 20/30 minutos antes do festival encerrar e já fomos para a Tangent Gallery, comemoração de 25 anos do Tresor (o famoso club emblemático de Berlin). No line up: Mike Parker (live), Silent Servant, Regis, Anthony “Shake” Shakir, Moritz Von Oswald, Claude Young, Dasha Rush e Dj Stingray. Embaçadíssimo!!! A galera era a mesma que estava na The Works na noite anterior: galera que gosta de som sério, hipnótico e dark (pesado “nas ideia” como diz meu amigo). Estava no meu paraíso novamente; todo mundo dança sem parar, não tem gente andando na pista, não tem paquera, não tem carão e “tá todo mundo se entendendo”… essa é a vibe que me faz voltar para Detroit… duas pistas: numa o som sério, hipnótico e dark; a outra menos hipnótica com mais espaço para experimentalismos e melodias (e house). Eu particularmente vi o Silent Servant, Mike Parker, Regis, Dasha Rush e Dj Stingray. E a noite foi do Regis e da Dasha Rush, ela que supriu a minha sede de um techno maximamente hipnótico como o do Oscar Mulero.

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A noitada foi daquelas: fechamos o Tangent Gallery, fizemos um “chilloutinho”, e não conseguimos chegar tão cedo no segundo dia de festival, mas foi o suficiente para vermos metade do live do Matador, que, com o perdão do trocadilho, foi Matador.

Eu confesso que muitos nomes deste ano eu desconhecia ou não me animavam o que gerou algumas surpresas! Acho que a melhor foi a do Loco Dice que tocou depois do Matador no main stage. Eu não sou muito fã dele, acho que ele toca um som meio progressivo, um troço que não ata nem desata, acho que tem um quê meio comercial, enfim… esqueça… ele tocou uma techneira justa, séria, quadrada, pesada, mandou até Decompression do Mathew Jonson (e conquistou meus elogios, rs), e fez eu bradar a minha velha máxima: no Movement os Djs descem a mão (perceba, velocidade para mim não é sinônimo de peso).

Então, eu fui para a pista Opportunity Detroit onde estava tocando o Mike Huckaby, e que estava mandando muito bem, fazendo um tipo de set que eu gosto muito e acho muito característico do pessoal de Detroit, que é misturar techno com house e com disco. No caso dele, estava mais para a house e disco; a pista era menor, aconchegante, penso que frequentada por uma maioria de Detroiters, todo mundo dançando e vibrando muito. Fiquei até o final, ele encerrou o set e a pista e foi aplaudido aos gritos “one more time”, mas mesmo assim a produção fechou a pista. O ponto alto, para mim, foi quando ele tocou Marshall Jefferson – Move Your Body. Ele também tocou um remix de House Nation, foi muito bom mesmo o set, ele seguraria a Made In Detroit tranquilamente.

Antes que eu chegasse no Huckaby, que para mim foi o set do dia, dei uma passadinha no Art Department e estava bem legal, um techno sério, tocou uma sequência de Shaker do Robert Hood com Energy Flash do Joey Beltram e deu aquela levantada na pista. Todavia, vi uma parte mais para o final do set, e achei meio “xôxa”; de qualquer forma não vi até o final.

Acabado o Huckaby fui ver o final do Adam Beyer e olha… main stage lotado, galera dançando muito e o som estava bom! Pesado, quase nenhum break, gravezão… foi divertido; de lá fomos para a que eu acho a pista mais bonita do festival, o Beatport Stage, que fica frente ao Detroit River que, ali, separa os E.U.A. do Canadá. Da pista se tem a vista do rio e da cidade de Windsor no Canadá, o visual é incrível, é mandatório curtir pelo menos um set nessa pista, principalmente durante o pôr do sol… coisa linda – em 2014 peguei o pôr do sol com o DJ Sneak tocando e foi sensacional – então, por causa do visual, fui lá curtir o som do Tale of Us. Já tinha visto um Boiler Room deles que não me agradou, porém fui surpreendido e o som estava bem legal e a iluminação também, foi um ótimo momento.

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Saímos do festival e decidimos dormir para ir a um famoso after às 7h da manhã do dia seguinte. Acordamos cedo e já fomos. O lugar é incrível e eu só falo o nome para quem for em 2017, rs… O line up nunca é revelado, mas sempre muito esperado. O lugar é um pub com um quintal gramado enorme, comemos um omelete por lá mesmo e já arrematamos com uma Corona. Às 9h da manhã já estava muito calor e tocava uma dupla que até agora eu não sei quem era… sei que eu estava na pista, de boas, torrando num sol fortíssimo, já por volta do meio dia, e percebo que eu estou ouvindo uma música do Mathew Jonson (que sou fãzasso), nisso chegou meu brother e disse: “cara, começou um live agora”, percebi que era um live “surpresa” do Mathew Jonson! Meu nível de alegria que estava em 100%, passou para 1.000%, eu adoro o som do cara e ainda não tinha tido a oportunidade de ouvi-lo tocando sozinho (já tinha visto em grupo, no Cobblestone Jazz), ele não fazia parte do line up do festival, nem de nenhum after, ou seja, jamais esperava ouvi-lo lá em Detroit. Foi épico… o Mathew Jonson fez um live praticamente analógico, cabulosíssimo, de umas duas horas, para umas 500 pessoas, na Techno City, num lugar maravilhoso, com um dia lindo, com a vibe perfeita, dispensável eu dizer que o som foi do @#$&*#@.

Obviamente, depois disso, cheguei super tarde no último dia do Movement, porém foi o suficiente para ver o set do Boys Noize que estava bastante intenso, rápido, um lance meio “maximal”não faz muito minha cabeça, tocou Jaguar e umas outras músicas conhecidas. O festival estava mais vazio que nos outros dias, é natural, pois são tantas festas que muita gente não aguenta o terceiro dia, eu mesmo nunca consigo chegar cedo. Depois dele entrou a Nina Kraviz, queridinha da galera, lotoooouuuu a pista Underground, e entrou com um som rápido, porém mais cadenciado: techno, apesar do carisma dela, não me agradou tanto (talvez eu já estivesse azedo). Saí de lá e fui para o main stage ver o que eu mais queria no Movement na segunda-feira: Modeselektor.

Foi muito boa a apresentação da dupla alemã, a sincronia entre a mixagem das músicas e das imagens é impressionante e a qualidade das produções musicais e visuais são de tirar o fólego, não é à toa que os caras gravam com personalidades como o Thom Yorke. A dupla tem carisma, o live é empolgante e tem pegada, todo mundo dançando o tempo todo. O show inteiro foi sinistro, eles tiveram um probleminha com o computador que não afetou a grandiosidade do momento, teve pulos com Evil Twim e German Clap, lágrimas com The White Flash, foi para fechar com chave de ouro mais um Movement.

E assim foi o meu Movement, já estou com saudades de Detroit… E para finalizar, fiz uma Playlist com algumas músicas que marcaram este ano, confira aqui.

 

 

 

 

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