Primeiramente, vamos nos lembrar de alguns casos (relativamente) recentes do cenário mainstream. Exemplos rigorosamente iguais seriam os dos projetos Bassjackers e Blasterjaxx. Ambos têm o renome para tocar (como já tocaram) no mainstage da Tomorrow Bélgica, e mesmo assim um membro de cada um dos duos desistiu da vida de tours. Com a ex-dupla Dzeko e Torres, o ocorrido foi ainda mais sério, no qual Torres realmente deixou o projeto, que se tornou a carreira solo de Dzeko.
No caso de DJs solo, o AVICII é um exemplo icônico. Para os poucos que não sabem, o artista desistiu (pelo menos até o momento) dos tours pelo mundo para se dedicar apenas à produção musical. O que faz DJs de tanto sucesso tomarem decisões que, para nós, meros mortais, parecem absurdas? Para nos ajudar a entender (parte) do problema, nada melhor que alguém que esteve diretamente envolvido nos explique:
“Eu tinha vontade de desistir da música, mas eu conseguia enxergar que na realidade não era eu que queria parar de fazer música, e sim essa energia negativa tentando assumir o controle. A música sempre foi minha paixão. Nunca quis fazer nada no mundo, apenas música. A única coisa que me impediu era o fato de que eu simplesmente não conseguia fazê-lo. Não consegui acessar minha energia de criatividade e foi o que me impediu.”
Mas o que seria tão grave e danoso a DJs como Nicky, que os levaram a ter esse tipo de pensamento? Ele mesmo nos responde: “A vida em tour é quase um ataque ao próprio corpo. Não é saudável em geral – o jetlag, a falta de sono, o horário de alimentação. Basicamente, você pode viver com isso se você deixar passar, ao invés de se preocupar com coisas ou tomar o estresse pessoalmente. O medo de entrar em crise e não poder progredir com o projeto é a pior parte do trabalho de DJ“.
Nota-se, portanto, que vários dos elementos da vida de um DJ contribuem para seu esgotamento mental e emocional. E esse acometimento tem um nome científico. É a “Síndrome do Burnout”, que é “um distúrbio psíquico de caráter depressivo, precedido de esgotamento físico e mental intenso, definido por Herbert J. Freudenberger como “(…) um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente ligada à vida profissional“.
A fundação Mental Health da Inglaterra afirma que 1 a cada 4 profiossionais em tour vai sofrer com algum problema de saúde mental na vida. Para a revista Only The Beat , Laidback Luke, grande DJ holandês, admite: “já tive a síndrome do Burnout duas vezes na vida. Às vezes, a única coisa que eu queria durante as crises era gritar…“. O artigo “The psychological impact of being in the spotlight: the emotional struggle of celebrities” nos lista alguns fatores que contribuem para o esgotamento emocional de artistas como os DJs, a citar: Falta de privacidade, despersonalização (perda do sentido do “eu”), falta de desafios (sim, aquele problema de quem já atingiu o topo e não encontra mais desafios na vida) e exposição midiática exagerada.
É interessante notar que essa problemática se estende às equipes envolvidas nos tours dos DJs. Empresários, fotógrafos, agentes de booking, public relation, e qualquer outro profissional que viaje em tour intensivo com os artistas (e também qualquer um que trabalhe nesse meio, como funcionários e promoters de clubs) estão em risco para o desenvolvimento do Burnout.
E o que chama a atenção: esse é um tema ainda pouquíssimo debatido entre os profissionais da música eletrônica. O artigo científico “Prevenção em Saúde mental” nos relata que podem haver sim planos efetivos em prevenção de problemas de saúde mental. A conscientização dos profissionais sobre os malefícios do estilo de vida pesado e da falta de descanso pode levá-los a conciliar o trabalho com medidas que diminuam o estresse, como maiores intervalos e maior tempo para sono. Ou, ao menos, pode permitir que reconheçam precocemente os sintomas do esgotamento mental e que possam procurar ajuda psicológica o quanto antes.
É inadmissível, portanto, que uma questão de tamanha prevalência (1 em cada 4 profissionais, lembra?) tenha relativamente tão pouca repercussão no meio da música eletrônica. A notícia de que Ollie abandonará os tours com Dada Life só nos confirma: precisamos de ações que lidem com a conscientização sobre saúde mental dentro das equipes dos profissionais envolvidos com música eletrônica. Enquanto isso não ocorrer, casos como de Ollie, que não é o primeiro (e nem será o último), estarão longe de deixar de existir.
Leitura complementar (em inglês) aqui.