Por: Salomão Augusto
Existe um grande limbo entre o warm up e o closing de uma pista. O sistema funcional de montagem de line ups no Brasil e no mundo funciona basicamente com o mesmo intuido: o de manter a pista viva na abertura e no momento do headliner da noite, sendo ele o DJ ocupante da última posição ou o intermediário entre os dois momentos. Estreitando esse pensamento com a visão do público, dá pra notar que uma pista linear se mantem concreta enquanto a atração principal não se apresenta. Caso ele seja o elemento no meio desse sanduíche, eis o ponto onde abordamos aqui: o closing bem feito.
Manter o dancefloor coerente, conciso e energizado até o fim, é quase uma maratona. O esforço utilizado se compara ao de um cirurgião em pleno ato. Aos habitantes da pista, o que importa é até onde o feeling e controle do DJ vai conseguir domá-los, uma vez que quando uma pista se abre, só Deus sabe a hora de se fechar um rolê, exceto clubs e ambientes que dependem de alvará para o seu funcionamento constante.
Diante desta dificuldade sumária, coletamos algumas opiniões experientes e iniciantes sobre esse assunto que assola tanto o pensamento dos profissionais da pista pelo mundo todo.
Múcio, DJ Turntablism, pesquisador da música brasileira e atuante no movimento samba rock brasileiro desde sua essência:
“Em primeiro lugar acho importante citar que a coerência e a pesquisa dos sets em relação ao horário ou ao estilo de pista são primordiais. Fechar uma festa é uma grande responsabilidade, visto que tocar depois do headliner não é fácil. Em minha opinião, o bom senso é o vai fazer a diferença nessa hora. Uma vez eu era responsável por fechar uma balada clássica de hip hop em Goiânia, e toquei depois de um DJ famoso do gênero. Mas nesse dia ele não estava inspirado e o público notou. Esperei ele finalizar o set e abri o meu com uma música do grupo do cara… a casa foi abaixo! Toquei até os seguranças pedirem pra parar.
Outra vez, em uma noite clássica na FICTION, eu faria o closing depois de uma banda de rock bem legal. Antes de entrar, um camarada que sempre estava lá me pediu pra tocar uma música do live. Eu na mesma hora pensei em “Pain Lies on the Riverside”, uma pedrada bem legal pra começar os trabalhos, né!? Mas eu não sei porque soltei “Selling the Drama”, que começa parecendo reflexão de analista… foi um puta desastre.”
Laurent F, DJ, produtor e idealizador do coletivo/festa Deep Crew de São Paulo, residente do D.EDGE club e artista do casting da D.AGENCY:
“Sou DJ residente do D.EDGE em São Paulo há 12 anos e por isso sempre me apresento fazendo o warm up ou o closing, então minhas considerações são baseadas nas experiências que tive e ainda tenho nessa condição, já que em festivais ou festas fora do club dificilmente sou escalado para esses dois horários.
Vejo o closing como um warm up invertido só que sem tempo limite para acabar. Sempre que fecho o club, minha preocupação é fazer as pessoas entenderem que, depois de quatro ou cinco horas de set em uma noite de quinta, talvez seja hora de descansar. Ou não. Deixe explicar melhor. Como disse, esse é um relato de um DJ que trabalha com a mesma equipe há anos, portanto quando chegamos às oito da manhã de sexta após uma noite cheia de energia, existe um entendimento comum entre as pessoas responsáveis pela noite de que é hora de acabar. O bar já não vende mais e as pessoas também na pista não têm mais tanta energia. É nessa hora que, pensando na salubridade do público e do staff, devemos praticar o warm-up invertido. Ou seja, acalmando o som da pista”.
Lucas Arruda (Lucas Arr), DJ, produtor, dono do selo Thousand Records, idealizador do coletivo Room Noise (Anápolis-GO) e artista do casting da D.AGENCY:
“O closing na maioria das vezes é uma tarefa bem difícil, mas isso pode variar muito em questão do dia e do horário que o evento está sendo realizado. Acho que é um horário que podemos nos arriscar mais, claro que tudo dentro do seu quadrado, e sempre haverá festas que não poderemos vacilar.
Como sempre digo, o certo é o DJ do closing chegar pelo menos antes do meio do set do “headliner” ou do DJ anterior para poder estudar a pista. Como a própria proposta da entrevista deixou claro, sempre corremos os riscos de esvaziar nosso dancefloor. Pode ser pelo cansaço do público ou um dia ruim para a cidade onde acontece o evento, ou às vezes até um público que não é acostumado a ir e pode não entender muito bem o que o DJ contratado pro closing está fazendo. Por isso temos que escolher as faixas a dedo para não deixar ninguém parado. Mas há exceções. Em algumas festas, o closing terá que ser no mesmo ritmo do warm up ou até mais “lento” – tudo varia da proposta da festa. Muitas vezes já encerrei o line up que foi um sucesso e outras tantas que foi um fracasso, porém como eu disse acima, isso gira em torno de muitos fatores, até mesmo do DJ não estar em um bom dia.”
David Santillo (Orange Boy), DJ, produtor e militante da música eletrônica na região Centro-Oeste do país, mais precisamente de Goiás, desde 2005 :
“Das inúmeras vezes que fui selecionado para fazer o closing da festas, posso destacar duas delas: uma na festa Coala na Diablo (club Goianiense) e a outra no club Moog, em Barcelona.
Na Diablo o pau quebrou da primeira até as três últimas “saideiras” que o povo pediu pra tocar. Já se passavam das quatro da manhã e mesmo assim a pista não ia embora, não acabava. O dono teve que chegar em mim e pedir pra acabar logo com aquilo. Até hoje uma das vibes mais incríveis que já presenciei no final de festa. Já no Moog em Barcelona, que nunca contei pra ninguém, foi o seguinte: Eu estava de férias com a família por lá e recebi um convite do promoter pra dar uma chegada no club, não para tocar, só para conhecer. Mesmo assim, preparei meus sons no pendrive pensando “vai que…”. Chegando lá a casa lotada, fila enorme do lado de fora e a pista bombando. Uma maravilha! Conversa vai e vem, o promoter me disse não ter mais o DJ pra fechar aquela noite e me ofereci pensando: “vim só pra curtir e vou sair com umas 10 gigs”. É agora!
O que eu não tinha sacado é que aquele club é conhecido pela forte cena de techno e eu comecei a tocar as coisas que toco como Orange Boy: trap, moombah, breaks e afins. Cara, foi terrível! Não deu uma da manhã e “DJ Moisés” entrou em ação abrindo quase que o club inteiro no meio.
Antes das 1:30am o promoter chegou em mim na cabine e pediu pra parar. Eu retruquei dizendo que ainda tinha gente na pista e ele disse que era o pessoal limpando a pista. Isso me faz ter a seguinte conclusão sobre o closing: fazer o público pedir mais uma. Se isso acontecer, a tarefa foi feita de forma digna. Caso contrário, Moisés e seu cajado estarão sempre de prontidão para entrar em ação.”