Por: Gabriela Loschi – matéria originalmente publicada na House Mag impressa número 44
Aos 36 anos o produtor belga batizado de Jérôme Denis descobriu um novo país preferido: o Brasil! A reciproca é verdadeira. Seu carisma sedutor e a simpatia aflorada cativaram os brasileiros durante as várias turnês que já fez por aqui – também ao lado do seu melhor amigo e sócio do selo LouLou Records, Kolombo. Tudo isso, aliado ao fato de ele apoiar diversos artistas brasileiros e do seu som dançante passear, segundo ele próprio, entre o deep house, o techno e g-house (combo fértil para o nosso território), gerou uma forte identificação com a nossa República, que já é praticamente a sua segunda casa.
LouLou Players – seu nome artístico – é uma simpatia em pessoa. Tivemos um papo agradável por Skype, quando ele nos mostrou muito mais do que uma personalidade divertida e um belo sorriso do outro lado da tela. Sentado confortavelmente em sua casa na cidade de Namur, na Bélgica, descreveu de maneira cativante a cena em que cresceu inserido – uma das mais antigas do mundo – e lembrou de histórias de sua adolescência e início de carreira. Seria uma bela tarde de primavera no Hemisfério Norte não fosse o fato de que, algumas horas mais cedo, naquele mesmo dia em que o estávamos entrevistando, seu país havia sido atacado por terroristas.
Quando as primeiras explosões se deram em Bruxelas, LouLou assistia a tudo pelos noticiários. Não tinha como nosso papo começar de outra forma:
HOUSE MAG – LouLou, boa tarde! Como você está, sua família, amigos, depois deste atentado horrível hoje ao seu país?
LOULOU PLAYERS – A situação está totalmente crazy. Na minha cidade não aconteceu nada, mas há policiais por toda a Bélgica. Estou indignado com essa situação, pois a segurança nos aeroportos sempre foi péssima, sendo que toda a Europa está em alerta com o terrorismo. Não gosto de falar de política, porque sinto que os políticos fazem tudo pelo dinheiro, e não pela população, mas estava esses dias mesmo conversando com um amigo, sobre a possibilidade da Bélgica estar na mira, depois dos atentados em Paris. Infelizmente aconteceu. Ninguém próximo a mim se machucou. Mas claro que isso afetou todo o ecossistema. Kolombo, por exemplo, tinha um vôo marcado para hoje de manhã para o México, mas foi adiado por dois dias. Ele está lá no aeroporto, falando comigo, talvez perca uma gig. Está tudo interditado.
HM – Você e o Kolombo são melhores amigos e parceiros na LouLou Records. Como vocês se conheceram?
LP – Nos encontramos a primeira vez em uma loja de discos local, há mais de 15 anos. Instantaneamente viramos amigos e não paramos de trabalhar juntos É ótimo poder compartilhar a paixão e o trabalho com o seu melhor amigo.
HM – Como foi ter crescido na Bélgica, que tem uma das cenas mais antigas do mundo e como foi o início da sua carreira?
LP – Com 7 anos eu já gostava de toca discos e de comprar records em lojas. Meu melhor amigo trabalhava com som. Lembro que eu queria comprar discos ingleses mas eu não falava inglês e tinha que ficar gaguejando, meus pais me ajudavam. Logo me interessei pelo French Touch, que estourou na Europa quando eu tinha uns 13, 14 anos. Aí tive uma fase esportista e até uns 17 anos competia aos domingo e não saia. Com 18, peguei a carteira de motorista e fui para o meu club preferido em Bruxelas, o Fuse. Não parei mais. Ali tocava Kevin Saunderson, Jeff Mills, Carl Craig… só peso! Comecei a trabalhar lá entregando flyers (depois montei minha própria empresa de promoção, que tenho até hoje), juntei dinheiro e comprei minha primeira pick up aos 19. Era caro. Toquei em bares, restaurantes, essas coisas, aí encontrei Kolombo e começamos a tocar juntos. Ele me apresentou ao Sharam Jay e nossas tracks saíram pela King Kong Records.
HM – Como está a cena na Bélgica hoje?
LP – Bélgica sempre foi berço pra música eletrônica, clubs por todos os lados. Tem até um filme chamado The Sound of Belgium (TSOB). Mas a cena mudou muito. Naquela época saíamos atrás de novidades. Hoje devemos ter 5 clubs unergrounds, no máximo. Percebo os jovens querendo ouvir tracks que eles já conhecem. Muito triste. Se tornou mais comercial.
HM – O que aconteceu, você acha?
LP – Naquela época éramos mais independentes para o som, depois veio muita influência da França, internet… a pesquisa dos jovens ficou mais preguiçosa. É triste pra mim. Essa foi uma das razões pela qual eu estava tão animado em ir ao Brasil pela primeira vez. Quando estou aí, percebo as pessoas envolvidas e curiosas pela música, me lembra aquela época na Bélgica, quando todos estavam em busca de algo novo. A cena no Brasil ainda está em crescimento e existem muitos artistas super interessantes aparecendo.
HM – Você faz colaborações com muitos deles, como Fran Bortolossi, Pimpo Gama, Bruno Be, Alternative Kasual. Quais produtores brasileiros você ainda quer trabalhar junto?
LP – Eles são bons amigos e fazem o tipo de som que eu adoro, é um prazer trabalhar junto. Estou muito feliz e orgulhoso do 100º release da LouLou Records ser mixado por ninguém mais ninguém menos que a lenda Gui Boratto. No futuro, eu gostaria muito de trabalhar com artistas como Digitaria, Volkoder,… Eu amo o trabalho e a personalidade deles.
HM – No after-movie da sua última turnê de Carnaval no Brasil você diz que Curitiba é a melhor cidade para música eletrônica no mundo, Você realmente acha isso?
LP – Falei muito sério. Pra mim, Curitiba é especial. Tem sempre alguém legal tocando e os curitibanos são curiosos, seguem o que acontece na música eletrônica! Se você tocar uma track cujo preview foi colocado no Soundcloud há dois dias, as pessoas conhecem! E a qualidade dos clubs como o Vibe ou festivais como Warung Day Festival e XXXperience, são prova deste fenômeno.
HM – A primeira vez que você veio para o Brasil, em 2013, você disse que o deep house é maior aqui do que em qualquer outro lugar do mundo. Você ainda acha que é? Por que?
LP – Sim, eu ainda acredito que seja. Nos últimos 3 anos houve uma evolução do gênero na América do Sul. Se você olhar a quantidade de produtores de música eletrônica, clubs e festas no Brasil, o país ainda é a cena mais forte em deep house do momento. A Argentina também está explorando bastante o deep.
HM – A música é um ciclo. Deep house começou a se tornar mais comercial de 2, 3 anos pra ca, EDM explodiu e o future house não cresceu tanto da forma como imaginavam. Que ciclo você acredita estarmos vivendo agora?
LP – Mesmo dentro do deep house há muitos estilos, mais undergrounds ou comerciais. Agora, com certeza o deep house está no topo, dos dois lados, underground e comercial. Eu acho que o lado comercial vai cair cada vez mais enquanto o underground vai continuar funcionando. É sempre assim. Música comercial está sempre pegando as últimas tendências do underground. Agora eu vejo o retorno de algo mais techno pra o topo.
HM – E no seu som, o que evoluiu e mudou do princípio pra ca?
LP – Meu estilo é sempre entre o deep house e o techno, com influências do g-house, mas não sou muito fã deste nome. Acho que se você pegar o Kolombo, por exemplo, ele sempre teve essa influência do hip hop. Ú vario bastante também. Agora eu estou tocando um pouco mais pesado e colocando mais energia nos sets do que há 3 anos.
HM – Que dicas você pode deixar aos novos produtores brasileiros?
LP – Eu diria aos brasileiros para irem além em seus trabalhos, para encontrarem o seu verdadeiro e único som. O trabalho contínuo é a melhor maneira de mover sua carreira para frente. Observe caras como Illusionize, Brune Be, Volkoder, Jean Bacarreza, Pimpo Gama, Dashdot… Todos eles têm o seu som próprio e são viciados em trabalho, workaholic natos. Esta é a chave do sucesso, aparecer com algo especial e muuuuuito trabalho!
HM – Hoje você está lançando um novo EP em parceria com o Pimpo Gama. Fale um pouco sobre ele.
LP – Após o sucesso da nossa primeira colaboração “Get Down Baby”, nós realmente queríamos partir pra próxima collab, um EP completo. Demorou alguns meses para desenvolvermos a ideia. Trabalhamos de maneiras diferentes da primeira vez, outros loops, outras ideias, colocamos separado em nossos estúdios. O processo foi muito interessante, quando um tinha uma ideia de loop, enviava para o outro para trabalhar nisso e vice e versa. Preparamos 4 tracks. O processo de “To Be The Only One” foi mais longo, sentimos que o instrumental tinha um grande potencial se encontrássemos um bom cantor (a). Não queríamos trabalhar com samples, queríamos algo 100% original, para servir para radio também. Percebemos que queríamos uma voz masculina e contatamos Russian Sevenever, que ja tinha releases na LouLou Records e eu ja o tinha encontrado meses atrás. Adoro sua vibe e alma. Enviamos pra ele a track e perguntamos se ele poderia cantar em cima. Duas semanas depois, tínhamos esse vocal forte, que eu adorei.
Tenho tocado o EP inteiro nas últimas semanas e acabei de receber feedbacks positivos, espero que funcione. Diria que é um EP energético e funky.
FALAMOS TAMBEM COM O PIMPO GAMA SOBRE O EP, QUE VOCE OUVE LOGO ABAIXO:
“No reveillon de 2015 o Jerome passou alguns dias na minha cidade (Chapeco) onde iríamos tocar a virada juntos, e de brincadeira no estúdio, em pouco mais de 4 horas surgia nossa primeira collab, ela se chamaria “Get Down Baby” e foi uma das tracks mais vendidas na Loulou Records no ano (hoje ela ainda figura no TOP 2 de vendas). A partir dai sempre ficamos trocando ideias, e com tantas boas criações surgiu a ideia do nosso primeiro EP juntos.